A usucapião de apartamento

A usucapião consiste em um modo de aquisição originário da propriedade, de acordo com critérios estabelecidos em lei, a exemplo do lapso temporal e posse mansa e pacífica. Bens públicos, por exemplo, não podem ser usucapidos. Uma pessoa que exerça a posse mansa, pacífica e ininterrupta durante determinado prazo especificado na lei poderá conseguir legalmente a aquisição da propriedade do bem (móvel ou imóvel) por intermédio da usucapião.

Dentre as várias espécies de usucapião há a usucapião especial urbana, também conhecida como usucapião constitucional, prevista no artigo 183 da Constituição Federal.

Referido artigo estabelece que “Aquele que possuir como sua área urbana de até duzentos e cinquenta metros quadrados, por cinco anos, ininterruptamente e sem oposição, utilizando-a para sua moradia ou de sua família, adquirir-lhe-á o domínio, desde que não seja proprietário de outro imóvel urbano ou rural”.

Assim, tem-se como requisitos para caracterização da usucapião especial urbana a área máxima de 250 m², a posse mansa e pacífica ininterrupta por cinco anos com animus domini, a utilização para moradia ou para família do usucapiente e, por fim, a inexistência de outra propriedade, seja ela rural ou urbana.

Em recente decisão, o STF entendeu que a usucapião especial urbana também se aplica a apartamentos em condomínios residenciais, e não apenas a lotes urbanos (Recurso Extraordinário (RE) 305416, julgado na sessão virtual encerrada em 28/08/2020). 

O caso se refere a uma moradora de um apartamento na cidade de Porto Alegre/RS, a qual pleiteia a usucapião do referido imóvel. 

Em sede de primeiro grau, a ação foi extinta sem julgamento do mérito, tendo como fundamento a impossibilidade jurídica do pedido. De acordo com o juiz, a pretensão da autora não se encontra amparada no artigo 183 da Constituição, por se tratar de um apartamento.

Interposto recurso de apelação, o Tribunal de Justiça do Rio Grande Sul manteve a sentença, entendendo que a norma constitucional se destina apenas a lotes e não a unidades de um edifício.

Tendo em vista a manutenção da sentença, a autora interpôs recurso extraordinário junto ao Supremo Tribunal Federal que, ao analisar a peça processual decidiu pelo provimento parcial, afastando a impossibilidade jurídica do pedido, determinando o julgamento do mérito.

O relator, Ministro Marco Aurélio, ao proferir seu voto, entendeu que a Constituição Federal em seu artigo 183 estabelece que é própria para usucapião a área urbana de até 250m² utilizada para moradia individual ou da família. De acordo com o Ministro, a razão do dispositivo é que, a partir da passagem do tempo, dos cinco anos, regulariza-se situação indispensável a ter-se a consolidação da moradia. Indispensável a usucapir é que, há cinco anos, o interessado venha utilizando o imóvel como moradia.

O ministro destacou, ainda, que o artigo 183 da constituição não distingue a espécie de imóvel – se individual propriamente dito ou se situado em condomínio horizontal. Segundo o relator, “Os requisitos constitucionais estão direcionados a viabilizar a manutenção da moradia”.

Salientou também que a área do solo correspondente ao apartamento que se pretende usucapir é inferior ao limite de 250m² e a área construída também assim deve ser percebida, porque, sob o ângulo da área real privativa, é equivalente a 80,10m², e da área real global, a 126m².

Ademais, frisa que que não se pretendeu, com a ação de usucapião, usucapir a totalidade do solo em que construído o edifício, mas tão-somente a propriedade individualizada como o apartamento 304, e aí hão de ser perquiridas as metragens a ele correspondentes.Por fim, concluiu pelo provimento parcial do recurso não para reconhecer o direito, em si, da recorrente a usucapir o imóvel, mas para afastar o óbice ao julgamento do mérito, porquanto a sentença do Juízo, confirmada pelo Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, implicou a extinção do processo a partir do disposto no inciso VI do artigo 267 do Código de Processo Civil, ante a impossibilidade jurídica do pedido.

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